04/01/2014 • Por Flávia Maciel de A. F. de Mendonça.Transcrito do sit site: http://www.gravidinhasemaezinhas.com.br/
Postado no facebook por Sandra Cainelli Bittencourt
Olá pessoal! Hoje quero compartilhar resumidamente com vocês
como foi a chegada da Bianca!
Para começar, vou me apresentar! Me chamo Flávia, sou
ginecologista e obstetra com uma tradicional formação médica. Fiz residência no
USP de Ribeirão Preto e logo comecei a trabalhar em maternidades e abri meu
consultório. Na minha graduação, tive contato com a humanização do parto por
ser aluna do digníssimo professor Paulo Batistuta Novaes, um ser humano
sensível que desde a década de 90 já entendia o parto como um evento natural e
fisiológico, e parte de seus ensinamentos ficaram em meu coração. Mas, com o
tempo, me tornei uma típica GO fofinha, com altos índices de cesarea.
Dai eu engravidei de forma milagrosa, pois tive um
diagnóstico de menopausa precoce e teoricamente não poderia engravidar. Mas
deus é maravilhoso! Esta gestação terminou em uma cesarea eletiva com 39
semanas por medo de parir, ansiedade e total despreparo, apesar do nível de
informação que achava que tinha. Remoia imagens de partos complicados, com
desfechos ruins, e para quem não poderia ter filhos, só de imaginar algo ruim
acontecendo ao meu, eu me desesperava. Mas, apesar de tudo ter corrido muito
bem, a cesarea foi uma grande frustração para mim - foi desconexo! Além disso,
na maternidade me separaram do meu bebê por horas e horas, ele não mamou, e
depois minha amamentação foi um fracasso. Eu simplesmente não acreditava em mim
ou no meu corpo.
Por conta desta experiência, entendi que deveria haver algo
muito errado com a forma como lidamos com a gravidez, parto e pós-parto, tanto
a nível institucional, quanto na forma como as mulheres encaram estes eventos
nos dias atuais. E o mundo da maternidade me fez conhecer pessoas totalmente
diferentes; nos grupos de mães da internet pude perceber como os procedimentos
obstétricos que realizamos rotineiramente muitas vezes geram traumas, frustrações
e sequelas irreversíveis físicas e emocionais; também conheci mulheres que
haviam tido experiências de parto totalmente diferentes, mulheres que haviam
parido em casa, que tiveram partos naturais, sem intervenções e o quanto aquilo
havia sido marcante como experiência de vida para elas.
Então, conheci o mundo da humanização e tudo fez sentido para
mim!
E 10 meses depois deste parto, engravidei novamente e me
senti abençoada pela oportunidade de fazer tudo diferente, de reescrever uma
história nova na minha família, na minha profissão e além, influenciando meus
alunos, colegas e outras mulheres.
Então, virei ativista e grávida e comecei a me preparar como
MULHER para parir. Isso quer dizer que fui esquecendo o lado profissional para
me encontrar com a minha essência, com o meu feminino, para buscar
empoderamento junto a outras tantas como eu, nos grupos de apoio, nas
conversas, nos relatos de videos de parto.
Depois que assisti, com muita vergonha, o Renascimento do
Parto (vergonha por ter pactuado por tanto tempo com esse modelo obstétrico
falido e tecnocrata), senti dentro de mim que queria parir em casa. Até para
mim admitir isso foi complicado. Imagina uma médica obstetra querendo parir em
casa com parteiras??? Mas o desejo foi crescendo, crescendo, e fui construindo
esse parto junto com meu esposo, meus amigos e colegas que me apoiaram, e
também enfrentando críticas e piadinhas a respeito da minha opção.
E assim no dia 28 de dezembro de 2013, com 39 semanas de 2
dias de gestação, fui me deitar e tentar fazer meu bebê de 1 ano e 7 meses
dormir - ele estava agitadíssimo. Numa das suas milhões de conversinhas, ele
deu um super tapa na minha barriga e falou "abre", como que dizendo
que tava na hora dela sair dali. Ele dormiu e meia hora depois (à 1 da manhã)
minha bolsa rompeu. Senti o líquido escorrendo na calcinha e mal podia
acreditar! Estava felicíssima!! Esperei as contrações começarem, tentei dormir,
mas aos poucos elas foram chegando, chegando, cada vez mais ritmadas e mais
intensas. Ás 4 da manhã já sentia que precisava de ajuda. Como estava tudo
planejado para um parto domiciliar, chamei minha doula Thaiane Caetano e as
parteiras (que moram em Campinas) Camila e Adriana. Acordei o marido e começou
aquele movimento dentro de casa.
Simplesmente TODA a minha família estava hospedada em casa -
dois irmãos e uma irmã com seus respectivos maridos e esposas, crianças e meu
pai) e estava muito preocupada pois não estava certa de como eles reagiriam ao
processo do trabalho de parto, mas resolvi apostar que daria certo.
Logo que minha doula chegou eu já estava no chuveiro sentindo
as contrações ficarem mais fortes. Ela trazia com ela a banheira de parto e
todos da família começaram a ajudar a encher a banheira, esquentando água, e
carregando as panelas de água, igual antigamente! Enquanto isso, na minha
banheira de casa eu tentava relaxar, mas já sentia uma dor na lombar bem forte.
Thaiane preparou o banheiro com velas, e massageava minhas costas, enquanto
cantava algumas canções. Fui afundando cada vez mais, entrando na partolândia,
perdendo os sentidos, a noção da hora e o controle da situação. Momento mágico
esse!
Logo fui para a banheira de parto, já com dore muito
intensas. Meu marido ficou o tempo todo na borda da piscina acocorado, e a cada
contrações era nele que eu me apoiava, segurando sua mão com toda força, e
entre as contrações, a Thaiane massageava minha lombar. Logo as parteiras
chegaram, assim como a Alessandra Santana, que fez o registro fotográfico do
momento de forma super discreta e sensível. A dor foi ficando muito, muito
forte, a ponto de eu pedir analgesia 3 vezes (mas eu havia escrito no meu plano
de parto que era para ignorarem todos os meus pedidos de analgesia e assim foi
feito! kkkk).
Interessante como no processo a gente perde o pudor, a
vergonha e vira bicho. Eu estava completamente nua, e me acocorava, me
ajoelhava, totalmente exposta mas me sentia completamente a vontade, e entregue
ao momento. Dai a importância de estar em um ambiente acolhedor e cercada de
pessoas que possa de fato confiar. Acho que não conseguiria me entregar da
forma como me entreguei se estivesse em um quarto de hospital.
Estava cansada pela noite sem dormir e com muita, muita dor.
Nesta hora, as parteiras me sugeriram deitar na cama e dormir (pasmem!) entre
as contrações. E foi exatamente isso que eu fiz, eu dormi, eu sonhei, eu
ronquei entre uma contração e outra!! Estava complatamente fora de mim, do meu
controle racional, eu só fazia força na contração e descansava entre uma e
outra.
Passado um tempo, a Camila (parteira) me sugeriu fazer um
toque para avaliar como estava o andamento das coisas, e para minha surpresa, a
cabecinha estava lá embaixo, só faltava parir! Nesta hora, eu mesma me toquei e
senti Bianca lá no períneo e isso me encheu de uma energia maravilhosa! Me
levantei como uma leoa e resolvi que ia parir! Escolhi sentar na banqueta de
parto e foi ali que fiz as derradeiras forças, gritando com todo o meu pulmão;
acompanhando tudo com um espelhinho, fui vendo Bianca abaular meu períneo,
distender toda a vulva e finalmente sair e ir direto para meus braços! Meu
Deus, emoção maior não há!!! Que cena linda, recebê-la diretamente para meu
colo, uma bebezona linda, rosa, chorando, foi algo que jamais vou esquecer. E
toda dor acabou ali, e foi só alegria e sorrisos!! Minha família vibrava do
lado de fora do quarto, quando ouviram o último grito e o chorinho dela, foi
uma festa geral!!! A Família Aguiar toda regozijando!
Minha princesa nasceu com 3540g, 49 centímetros e Apgar
10/10. É vermelhinha, parece uma pitanga! Olhos castanhos bem escuros, a cara
do pai e do irmãozinho!
Depois do parto, me deitei em minha cama para a expulsão da
placenta e a revisão do canal de parto. Bianca mamava com uma pega perfeita, e
muita vontade de sugar! Uma criança pronta para vir a mundo! O pai corta o
cordão umbilical e Bianca assume assim sua própria vida. E ai acontece uma cena
linda de viver: Rodriguinho chega no colo do pai, é apresentado a irmã e ele
pergunta: "neném?" Sim, meu filho, é a Bianca, o seu tão aguardado
neném!! E ele fica ali, examinando a irmã, tocando com as pontinhas dos dedos
sua cabecinha, barriguinha, nariz, orelhinha..... coisa mais linda esse
reconhecimento! Foi muito emocionante presenciar tudo isso.
Depois que as parteiras acabaram de dar alguns pontos em
algumas lacerações superficiais, pude ficar deitada na cama, amamentando e
recebendo meus irmãos, cunhados e meu pai para conhecer a pequena. Que coisa
boa poder estar em casa nesse momento! No conforto do meu quarto! As parteiras
iam arrumando toda a bagunça, enquanto comia um misto quente com suco de
laranja.
Logo depois me levantei, tomei um banho gostoso, me arrumei,
ajudada pelas parteiras, que são muito mais que profissionais, são pessoas
humanas que não tem vergonha de te ajudar a vestir uma calcinha ou uma roupa. E
assim, toda arrumadinha, pude almoçar a comidinha da minha funcionária Lu
enquanto amamentava minha pequena sentada na minha cama. Tudo muito simples e
natural!
Não tenho palavras pra descrever o quanto esse momento foi
especial para mim, e o quanto valeu a pena me informar, me empoderar, lutar
contra o sistema e as críticas dos colegas e de tantas outras pessoas, mas NÓS
CONSEGUIMOS!!! Conseguimos porque nosso corpo foi feito para isso, basta
acreditar!
Uma semana depois, olho para trás e penso que faria tudo de
novo, viveria toda aquela dor de novo, passaria por tudo de novo. Foi lindo!
Sou outra pessoa, uma mulher e mãe muito mais forte. Foi a experiência da minha
vida que mais me trouxe crescimento.
Minha luta agora será maior ainda, para que toda mulher tenha
direito de parir assim, com respeito e dignidade, com segurança e aconchego, e
que todo bebê possa vir ao mundo acreditando que aqui é um bom lugar para se
viver.
Beijos,
Flávia
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